terça-feira, janeiro 15, 2008

Minha Visita Ao Mosteiro




Acabei de voltar do Mosteiro da Ressurreição, Ponta Grossa - PR. Foi uma experiência e tanto, mais pra mim do que para os monges, confesso.


Tivemos a oportunidade, eu e meu amigo Ronaldo Perini, de passar três dias dentro do claustro, o que normalmente não ocorre, pois os visitantes ficam na casa de hospedagem - afinal, monge não é "ponto turístico ou peça rara no museu da cristandade". Mas, como estava cheia a hospedaria, o Abade permitiu que entrássemos um pouco mais fundo na vida da comunidade monástica.


Não dá ainda pra entender e expressar de forma escrita tudo o que se deu comigo naqueles dias, e isso parece bastante com a ênfase da espiritualidade do deserto: o coração é mais importante que a mente, apesar desta não ser desprezada (perguntou-se a um monge se ele não tinha interesse de estudar, ao que respondeu: "entrei aqui para estudar o crucifixo, e até hoje estou tentando. O que a cruz não me ensinar, nada mais pode fazê-lo". Tal monge está lá há 61 anos...). Ainda estou digerindo a experiência. Uma coisa é colocar o nome no blog de "O Pastor E O Monge", e outra bem diferente é o "pastor tentar viver como um deles...". Mas, vamos lá...aí vão minhas impressões:


1) A vida devocional deles coloca a de qualquer evangélico no bolso. Os caras param sete vezes por dia para louvar a Deus nos ofícios, cantando salmos, lendo a palavra, confessando pecados, pedindo misericórdia a Deus. Eles lêem o Saltério todo a cada 15 dias!!! Acho que desde "Daniel na Babilônia" ninguém ora tanto...e olha que ele parava só três vezes por dia!!! Lutamos pra fazer o povo evangélico ter uma devocional de pelo penos 15 minutos por dia...e ler a Bíblia 1 vez ao ano...


2) A disciplina inserida no cotidiano pelos monges, deveria ser praticada por todos os cristãos. Eles têm uma vida regrada. Tempo de orar, de trabalhar, de alimentar-se, recreio, banho, dormir, etc. Parece escravidão, mas o dia rende extraordináriamente e eles realizam muito a cada dia. "Acho" que é na Bíblia tá escrito alguma coisa como "remi o vosso tempo". Passamos horas incontáveis diante de internet e tv, atividades que até têm o seu lugar, mas que estão se tornando o nosso "altar" diário.


3) A afetividade para com os visitantes faria vergonha ao ambiente de muitas igrejas. Nunca fui tão abraçado em tão pouco tempo...parecia que eles estavam reencontrando um grande amigo de longas datas! Num dos dias acabamos não almoçando no mosteiro e como nossa refeição foi "tarde e farta", decidimos um fazer "jejum" do jantar. Um dos monges, acho que o mais velho e o que lá está há mais tempo, percebeu nossa ausência. Quando nos encontrou, já lá pelas 20 hs, disse que não podíamos dormir sem comer nada e foi ao galinheiro, catou uns ovos e fez o melhor omelete que já comi em minha vida. De bandeja ainda passou um café fresquinho. Senti-me mais bem tratado do que em muitas igrejas que já fui pregar. Um dos ítens da regra de São Bento - que formatou em suas orientações a vida monástica - é: "receba a todos como ao próprio Cristo". Eles levam isso a sério...se seguíssemos o mesmo em nossas comunidades já teríamos experimentado um novo avivamento.


4) O monge segue a orientação do Abade, o "pastor do mosteiro". Fiquei pensando na autoridade do Abade dentro da comunidade e o carinho que todos têm por ele. Ele é o "pai" de todos e suas orientações são seguidas com reverência. É certo que há pastores que não conquistam tal relação com seu próprio rebanho por deficiências pessoais, mas, em quantos lugares o "pastor" é tratado como mero "funcionário" da igreja e que deve cumprir suas "obrigações porque ganha seu salário para isso"? Quanto sofre o coração do "pastor" por falar, falar e falar ao seu rebanho e ver-se ignorado pela comunidade? Penso no quanto o advento do "individualismo" tem gerado um sem número de homens e mulheres que não conseguem submeter-se a autoridade de um líder espiritual, pois desejam apenas "homens de Deus" que lhe sejam sempre favoráveis, um perfeito puxa-saco. Gente que pastoreia a si própria e faz do pastor o gerente do negócio religioso. Muitos aceitam o cargo.


5) O silêncio no mosteiro é intencional e praticado como regra. Até na hora da refeição eles evitam o ti-ti-ti. Enquanto comem algum monge escalado faz a leitura de algum "Pai da Igreja" e aos domingos ouvem ópera enquanto comem..."mente vazia...". A quietude é prezada por embasar a vida vivida para Deus. Sem silêncio enganamo-nos a nós mesmos e projetamos sobre "deus" nosso próprio eu. Cultivar uma vida silenciosa é a prerrogativa para alguém tornar-se "espiritual", ou seja, manifestar Cristo no viver. Queremos "Seu poder", "Sua majestade" e "Sua autoridade", mas seu estilo de vida - SILENCIOSO - , fonte de onde retirava seus recursos espirituais, desprezamos. Queremos cultos com muito movimento, barulho e entretenimento ("mantenha-nos sorrindo..."), porém, a verdadeira espiritualidade cristã é filha do silêncio, onde podemos entrar em contato não apenas com Deus, mas com nosso próprio coração, donde provêm as fontes de nosso viver. É fato que isto trata-se de um aprendizado. Ninguém se tornará "quieto" ou disposto a quietude do dia para a noite. É necessário prática, abrir espaços de silêncio no dia-a-dia e na agenda, mas se abdicarmos desta disciplina, é possível que estejamos profanando o aspecto mais fundamental da proposta da espiritualide cristã: o silêncio.




Bem, acho que escreverei mais nos próximos dias. O coração ainda está em reboliço. Enxerguei-me mais de perto, e como disse meu amigo Ronaldo, "não gostei do que vi". Foi um tempo de reavaliação da caminhada, como cristão, marido, pai, amigo...não sobrou nada! Ehehehe! Estou em reconstrução, fechado pra balanço e praticamente decretando a falência da espiritualidade que me trouxe até aqui e pela qual o mundo gospel clama, sem saber aquilo que pede: "pedra no lugar de pão". Decidi que não quero mais conquistar o mundo. Desejo apenas conquistar a mim mesmo, oferecer-me como libação ao reino de Deus, libertar-me de tudo quanto ainda me escraviza e diminui a posse do Espírito sobre minha vida. Aos navegantes aviso: algo mudou dentro de mim, e aconteceu dentro de um mosteiro...

2 comentários:

Luiz de Moraes disse...

Eu adoraria poder fazer uma experiência dessas também!... A única coisa que não me atrai na vida monástica é não poder sair para evangelizar. Mas a vida regrada, espiritualizada, silenciosa e comunitária faz um bem imenso para a alma! Acho que é o estado de vida em que melhor se vive em tranquila comunhão com Deus.

Anônimo disse...

Amados irmãos, para conhecer melhor a espiritualidade dos monges e a chamada "espiritualidade de baixo" sugiro os livros do ANSELM GRUN: "Espiritualidade a partir de si mesmo" e o "Céu começa em você" entre outros... pesquise na net e examine esses livros e outros, me ajudou e creio que ajudará a muitos. Paz e Graça!